segunda-feira, 9 de agosto de 2010

As Barreto

Não sei se é assim com todas as pessoas, mas eu às vezes lembro-me de pessoas que fizeram parte da minha vida, da quais não me lembrava há muito tempo.
No final da semana passada aconteceu com umas amiguinhas de infância.
E o engraçado é que inicialmente me lembrei delas porque falei com alguém que tem o nome de família delas, Barreto e depois por causa dos incêndios que neste momento assolam o nosso país. É que a família dela, numerosa, eram quase todos, ou bombeiros ou membros da fanfarra.
Mas essas minhas amiguinhas, duas irmãs de uma família típica do início da década de 70. Viviam no 'Bairro da Caixa', o número de irmãos atingia a dezena, o pai trabalhava na 'fábrica das bicicletas' e a mãe 'estava em casa', onde tomava conta dos filhos mais novos e dos netos, filhos dos irmãos mais velhos.
Zeza e Nanda eram os nomes delas. A Zeza, tinha a minha idade e a Nanda era mais velha um dois anos. Era uma miúda rebelde que gostava de trepar às árvores, de ir para o rio nadar, de jogar futebol e brincar com sameiras. Fugia da escola e muitas vezes de casa. Tirando isso era uma boa amiga, que nunca nos deixava sós, a mim e à irmã e muita, chegando a lutar com rapazes para defender a irmã.
Aos olhos da sociedade da época, eu era suposto estar num patamar social acima do delas. O meu pai já tinha uma certa posição na empresa, morávamos num 'andar' no centro da vila e eu era filha única. Por isso aos olhos da sociedade da época não era suposto eu ser amiga dos meninos do 'Bairro da Caixa', onde moravam os trabalhadores das industrias das redondezas com as suas famílias numerosas. A par dessas famílias viviam também aqueles, que sem famílias numerosas estavam marginalizados pela sociedade da época pois 'tinham estado presos'. Eram uma coisa que não se podia dizer na época: comunistas!
Bem, mas eu era amiga dos Barreto, dos Calado, dos Barbosa, assim como era amiga dos Quelhas, a família mais in da zona. Tudo meninos daquele bairro que eu conheci inicialmente na mestra e depois mantive a amizade na primária. Pois, e a propósito da 'mestra', eu também não era suposto ir para a mestra, mas sim ficar em casa com a minha mãe... ou ir para a Lumen ou para o Luso Francês, os colégios 'in' das redondezas.
Pois e eu lembrei-me delas hoje, eu queria contar um pouco mais da história delas. Divaguei, o que é normal em mim, e não disse o que tinha para dizer sobre elas.
E como ficará para um outro post a história delas, remato este dizendo que a educação que tive não foi a que 'deveria' ter tido aos olhos dos padrões da época, mas a educação que os meus pais me quiseram dar, porque acharam mais apropriada. Lidar com as realidades, relacionar-me com todas as pessoas e aprender por mim que há pessoas diferentes, que umas não tinham tanto como eu e outra tinham mais, mas, e estamos a falar de bens materiais; isso não era o mais importante!
Acertaram, apesar de em algumas fases da minha vida ter sido 'penalizada', no entender dos outros, por isso.
Eles é que perderam e não eu.
Não perdi nada por brincar com os meninos do bairro, por lhe emprestar os meus livros e os meus brinquedos e muito menos por os levar para minha casa.
Tinham piolhos, diziam os outros. E daí? Os outros não tinham? Tretas!
Da Zeza e da Nanda, assim como da Emíla ou da Eva (lembrei-me delas agora) falarei bevemente...

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