sexta-feira, 8 de maio de 2009

Lembrei-me de ti hoje...e sempre

Olá Paulo,

De ti não tenho fotos, um livro, uma carta… só recordações das nossas conversas, dos nossos passeios e do teu sorriso. Tinhas o sorriso mais sereno que eu conheci. Rir não rias, sorrias e era uma constante ver-te sorrir das traquinices e das tarantices minhas e da Paula. Quase riste quando a Paula te enviou uma carta com um selo fiscal. Tu não te enganavas, tu não falhavas. Tu tinhas as melhores notas da turma, da escola.Tu não brincavas!
Nos intervalos sentavas-te num banco a ver-nos saltar, correr, cair… mas ironicamente, um dia apareceste na escola com um braço ao peito. Pisaste um carrinho do teu irmão mais novo e caíste escada abaixo. O resultado foi o braço direito engessado durante um mês!

Um dia, o meu pai, amigo do teu tio, telefonou-me a perguntar se eu sabia de ti. Tinhas fugido de casa. Eu não sabia, a Paula não sabia, ninguém sabia. Não tinhas dito a ninguém, nem às tuas grandes amigas. Foste apanhado quando tentaste comprar uma viagem clandestina num barco para os Estados Unidos. Querias ir para a NASA. Ingénuo! Depois de uma longa conversa com os teus Pais, ficou combinado que mudarias de área, acabarias o 12º ano e no final eles deixavam-te ir estudar para os EUA. Enganaste-nos a todos. Iludiste-nos com o entusiasmo, falso, com que agora encaravas as coisas.

Quebraste o trato. Um dia, os teus pais receberam a notícia de que tinhas dado entrada no hospital de S. João em muito mau estado: tinhas-te atirado abaixo do tabuleiro superior da Ponte D. Luiz. Não fizeste nada para sobreviver. Sempre que os médicos se aproximavam , as tuas palavras eram: ' Não percam tempo comigo. Eu estou aqui porque quero morrer. Vão tratar de pessoas que querem viver.' Acabaste por morrer. Pela primeira vez fui a um funeral. A tua morte foi muito noticiada. Disse-se muita coisa. Especulou-se muito, como se especula de tudo sobre o que se sabe pouco! 'Morreu porque quis', era a frase mais ouvida. Não acredito. Conhecia-te o suficiente para saber que era uma fase má. Que provavelmente era mesmo o que querias naquele momento, mas que se alguém ou alguma coisa to tivesse impedido, agora estarias aqui a rir-te da palermice que tinhas feito quando tinhas 16 anos. Ontem estreou em Portugal, onde tu não estarias se vivesses, um filme novo do Star Trek… ter-me-ias, a mim e à Paula, convidado para ir ver. Sabias que não gostávamos, mas dizias que um dias nos ias fazer gostar de filmes de ficção científica… não tiveste tempo e nós não quisemos gastar tempo a aprender… sem ti.

Um grande beijo, amigo

3 comentários:

Alberto Velez Grilo disse...

Extraordinário...

Um beijinho. Vou ver o Star Trek

Reflexos disse...

Bom filme...
Bjinhos

Uma louca ai disse...

Mto bom seu texto!
Adorei...
Bem profundo.

Parabéns!

Bjos..