'Alberto, anda tirar a tigela do pão-de-ló do armário, se fazes o favor.' ou 'Ó Dete, vai buscar o escadote pequeno, para tirares a tigela do pão-de-ló do armário'
Era assim que começava a odisseia do pão-de-ló, com a Avó a pedir ao Avô ou à Mãe para tirarem a tigela lá do cimo da última prateleira do armário grande.
Do alto dos meus quatro, cinco anos, achava aquele armário enorme, e que nunca iria conseguir chegar lá ao cimo, ao tecto... onde só o Avô, que era grande, muito grande, maior que o Pai, chegava... e com a ajuda do banco da cozinha... e a Mãe, mas essa só com o 'escadote pequeno'!
Era uma tigela grande, alta e branca. A Avó quando estava a bater a massa, só a muito custo a segurava só com um braço... mas como já lhe tinha tinha tomado o jeito, a coisa corria bem!
A primeira coisa a fazer era lavar a tigela, secá-la muito bem e começar a prepara os ingredientes: Farinha, da especial, comprada no padeiro; os ovos das galinhas do capoeiro; açúcar, do branco... a Avó ainda usava no dia a dia açúcar amarelo, dizia que era mais saboroso!
Começava por separar as gemas das claras: as gemas iam para a tigela e as claras para uma outra, uma qualquer, sem ´patente'... Sentava-se num banquinho da cozinha, com a tigela no colo, segura com um dos braços a a mexer freneticamente as gemas com a açúcar até ficarem cremosas. Era tarefa para... muito tempo, sei lá eu... aos quatro anos tudo que os adultos fazem dura uma eternidade!
Eu, sentava-me ao lado dela a seguir com o olhar o movimento da colher, enquanto a Avó me contava uma história... a Avó era uma boa contadora de histórias... contava histórias lindas, daquelas que não vêm nos livros... só na herança da memória de avô para neto... estas vinham da avó dela, que era espanhola, dizia ela.
Quando as gemas e o açúcar estavam em creme, era a vez das claras em castelo... e da segunda parte da história... No final da história, as claras ficavam em castelo firme. Era, então a altura de juntar as claras e a farinha à gemada, que esperava ansiosamente na tigela branca dos bolos. Era tudo mexido cuidadosamente, sempre para o mesmo lado. Nesta altura a Avó calava-se e concentrava-se naquela tarefa... a massa não podia talhar! Depois deitava, como ela dizia, numa forma de barro, própria para pão-de-ló, que também aparecia, não sei bem de onde, do sótão talvez, e que tinha sido previamente forrada com papel pestaneira, o de pão-de-ló e pronto lá era vertida a massa para a forma!
Vinha, então, uma das partes que eu também muito esperava... era a Avó a rapar a taça com o salazar e eu a pensar baixinho 'já chega, já está bem'... é que eu adorava comer aqueles restinhos de massa que ficavam na taça!
A Avó colocava em cima da forma uma outra igual, embrulhava aquilo num pano grande, amarrado pelas quatro pontas e ficava a li até depois do jantar.
Naqueles dias, o jantar era rápido, porque depois de jantar íamos as três, eu a Avó e a Mãe para o padeiro pôr o pão-de-lóa cozer no forno do pão!
Que festa! Assim como nós, iam as mulheres da freguesia quase todas, para lá para cozer o pão-de-ló. Era um forno a lenha, grande, onde o o Sr. Carlos Padeiro, filho da terra também, ainda sobrinho do Avô, ia metendo as formas uma a uma com a ajuda de uma pá, que tinha um cabo muito comprido!
Nesta parte, a minha memória tem 'uma branca', lembro-me que depois de as formas estarem dentro do forno, as mulheres começavam a conversar. Algumas levavam cevada, tigelas e manteiga, que punham no pão que entretanto tinha saído do forno e comiam acompanhado da cevada... daqui as minhas lembranças dessa noite nunca passaram. Sempre quis beber a cevada e comer o pão quente com manteiga, mas fui sempre vencida pelo sono e só me lembro de acordar no dia seguinte na minha caminha, de me levantar, ir à cozinha e de ver, em cima da mesa, um pão-de-ló todo pomposo! O melhor pão-de-ló... o da Avó, cozido no forno do Carlos Padeiro!
'Alberto, podes guarda a tigela do pão-de-ló no armário?'
E pronto, e lá voltava a tigela para o lugar dela até ao ano seguinte. Por vezes ainda fazia uns trabalhinhos extra na Páscoa, ou quando alguma vizinha precisava de fazer um bolo para uma ocasião especial a pedia emprestada à Avó, mas era raro, muito raro mesmo!
Agora a tigela está reformada. Vive num armário, na parte de baixo e não trabalha... vê as outras trabalharem, na Páscoa, no Natal, nos aniversários... ora são usadas para a mousse, ora para as saladas de fruta, ora para muita coisa, mas não só no Natal, nem tão pouco para a massa do pão-de-ló cozido no forno a lenha do Carlos Padeiro... essas honras eram dela e noutros tempos!
Era assim que começava a odisseia do pão-de-ló, com a Avó a pedir ao Avô ou à Mãe para tirarem a tigela lá do cimo da última prateleira do armário grande.
Do alto dos meus quatro, cinco anos, achava aquele armário enorme, e que nunca iria conseguir chegar lá ao cimo, ao tecto... onde só o Avô, que era grande, muito grande, maior que o Pai, chegava... e com a ajuda do banco da cozinha... e a Mãe, mas essa só com o 'escadote pequeno'!
Era uma tigela grande, alta e branca. A Avó quando estava a bater a massa, só a muito custo a segurava só com um braço... mas como já lhe tinha tinha tomado o jeito, a coisa corria bem!
A primeira coisa a fazer era lavar a tigela, secá-la muito bem e começar a prepara os ingredientes: Farinha, da especial, comprada no padeiro; os ovos das galinhas do capoeiro; açúcar, do branco... a Avó ainda usava no dia a dia açúcar amarelo, dizia que era mais saboroso!
Começava por separar as gemas das claras: as gemas iam para a tigela e as claras para uma outra, uma qualquer, sem ´patente'... Sentava-se num banquinho da cozinha, com a tigela no colo, segura com um dos braços a a mexer freneticamente as gemas com a açúcar até ficarem cremosas. Era tarefa para... muito tempo, sei lá eu... aos quatro anos tudo que os adultos fazem dura uma eternidade!
Eu, sentava-me ao lado dela a seguir com o olhar o movimento da colher, enquanto a Avó me contava uma história... a Avó era uma boa contadora de histórias... contava histórias lindas, daquelas que não vêm nos livros... só na herança da memória de avô para neto... estas vinham da avó dela, que era espanhola, dizia ela.
Quando as gemas e o açúcar estavam em creme, era a vez das claras em castelo... e da segunda parte da história... No final da história, as claras ficavam em castelo firme. Era, então a altura de juntar as claras e a farinha à gemada, que esperava ansiosamente na tigela branca dos bolos. Era tudo mexido cuidadosamente, sempre para o mesmo lado. Nesta altura a Avó calava-se e concentrava-se naquela tarefa... a massa não podia talhar! Depois deitava, como ela dizia, numa forma de barro, própria para pão-de-ló, que também aparecia, não sei bem de onde, do sótão talvez, e que tinha sido previamente forrada com papel pestaneira, o de pão-de-ló e pronto lá era vertida a massa para a forma!
Vinha, então, uma das partes que eu também muito esperava... era a Avó a rapar a taça com o salazar e eu a pensar baixinho 'já chega, já está bem'... é que eu adorava comer aqueles restinhos de massa que ficavam na taça!
A Avó colocava em cima da forma uma outra igual, embrulhava aquilo num pano grande, amarrado pelas quatro pontas e ficava a li até depois do jantar.
Naqueles dias, o jantar era rápido, porque depois de jantar íamos as três, eu a Avó e a Mãe para o padeiro pôr o pão-de-lóa cozer no forno do pão!
Que festa! Assim como nós, iam as mulheres da freguesia quase todas, para lá para cozer o pão-de-ló. Era um forno a lenha, grande, onde o o Sr. Carlos Padeiro, filho da terra também, ainda sobrinho do Avô, ia metendo as formas uma a uma com a ajuda de uma pá, que tinha um cabo muito comprido!
Nesta parte, a minha memória tem 'uma branca', lembro-me que depois de as formas estarem dentro do forno, as mulheres começavam a conversar. Algumas levavam cevada, tigelas e manteiga, que punham no pão que entretanto tinha saído do forno e comiam acompanhado da cevada... daqui as minhas lembranças dessa noite nunca passaram. Sempre quis beber a cevada e comer o pão quente com manteiga, mas fui sempre vencida pelo sono e só me lembro de acordar no dia seguinte na minha caminha, de me levantar, ir à cozinha e de ver, em cima da mesa, um pão-de-ló todo pomposo! O melhor pão-de-ló... o da Avó, cozido no forno do Carlos Padeiro!
'Alberto, podes guarda a tigela do pão-de-ló no armário?'
E pronto, e lá voltava a tigela para o lugar dela até ao ano seguinte. Por vezes ainda fazia uns trabalhinhos extra na Páscoa, ou quando alguma vizinha precisava de fazer um bolo para uma ocasião especial a pedia emprestada à Avó, mas era raro, muito raro mesmo!
Agora a tigela está reformada. Vive num armário, na parte de baixo e não trabalha... vê as outras trabalharem, na Páscoa, no Natal, nos aniversários... ora são usadas para a mousse, ora para as saladas de fruta, ora para muita coisa, mas não só no Natal, nem tão pouco para a massa do pão-de-ló cozido no forno a lenha do Carlos Padeiro... essas honras eram dela e noutros tempos!
( História para a Fábrica de Histórias)
3 comentários:
Fabrica? Esta história parece pura realidade ;)
...pois, quando era miúda a minha avó ia cozer o pão de lá à padaria... e a tigela existe...
Gostei imenso desta história, são tradições que já lá vão.
Muitos parabéns, adorei esta história, são recordações que nunca se esquece.
Aprendemos muitos com os avós.
Com os melhores cumprimentos
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